Pela primeira vez, os alunos tiveram a oportunidade de realizar um intercâmbio nacional, de curta duração, para alguma universidade de odontologia do Brasil. Após o período de inscrições e um concorrido processo seletivo, foram selecionados 10 estudantes da graduação para viajarem, em duplas, e conhecerem uma faculdade diferente, localizada entre cada uma das cinco regiões nacionais.  

Para entender melhor essa visita, a coluna “FOUSP no Brasil” conversou com as alunas Diênifer Birmann Ramos e Ana Luiza Lucena Longo, que estão no último ano e realizaram o intercâmbio na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), em Minas Gerais. 

Por que escolheu essa universidade?

Diênifer: Dentre as nossas opções, Uberlândia era uma delas, por ser do interior e da região sudeste (proximidade com São Paulo).

Ana Luiza: Eu digo que a faculdade me escolheu, pois foi minha terceira opção. O meu foco é a odontologia forense, então lá tive contato com o Professor Thiago Beaini, que estudou na FOUSP e realiza projeto em conjunto com o Prof. Dr. Rodolfo Melani, na área de reconstrução facial. 

Como foi o processo seletivo? 

Diênifer: Foi por envio de documentação sobre nosso histórico escolar dentro da FOUSP. Acredito que o diferencial tenha sido a quantidade de envolvimento que possuo com atividades extracurriculares, somado as minhas 4 iniciações científicas realizadas.

Ana Luiza: Envolveu o envio e a análise de diversos documentos: carta de motivação, currículo lattes, histórico escolar, além de uma ficha com nossos dados pessoais, média ponderada, média normalizada e a descrição das universidades que gostaríamos de ir, por ordem de prioridade. Nós achamos que o que fez diferença na nossa seleção foi a quantidade de iniciações científicas que fizemos até o momento.

Qual foi sua principal motivação para realizar o intercâmbio?

Diênifer: Conhecer outros métodos de ensino de Odontologia no Brasil.

Ana Luiza: Eu sempre desejei realizar um intercâmbio internacional, mas, por vários motivos, não consegui durante a graduação. Então, a realização do intercâmbio nacional me permitiria concluir parte dessa meta, mesmo sendo nacional, além de conhecer outra universidade, outros modos de aprender e também a oportunidade de conhecer outra cultura e lugar. 

A universidade visitada e a grade horária mudam muito em relação à FOUSP? O que mais gostou nela? Quais as principais diferenças?

Diênifer: Em relação às disciplinas, achei bem semelhantes à FOUSP, entretanto, há duas diferenças notáveis: a UFU (Universidade Federal de Uberlândia) possui um Hospital 24h com o PSO (Pronto Socorro Odontológico) e os alunos precisam fazer em torno de 18 plantões para se formar (podem dormir no hospital), juntamente ao curso integral deles, o que torna a carga horária bem extensa. Nesse PSO, os alunos possuem maior autonomia na resolução de emergências devido ao fluxo intenso de pacientes. Por exemplo, em apenas um plantão de 12 horas, a minha recém conhecida colega Giovanna realizou seis exodontias, duas aberturas coronárias, uma pericoronarite e uma remoção de cárie. Nesse cenário, os alunos saem melhor preparados para lidar com diversos atendimentos, em um curto espaço de tempo. 

Ademais, a FOUFU (Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Uberlândia) possui o Ambulatório de Freio Lingual e de Amamentação, e foi a clínica que mais gostei por ser um atendimento multidisciplinar, com atuação, não só de cirurgiões-dentistas, mas psicólogos, consultores de amamentação, fonoaudiólogos e nutricionistas, no mesmo atendimento clínico. Acompanhamos um neném de 12 dias amamentando no peito da mãe, em tempo real, após a pesagem para ver se ele havia ganhado peso, e pudemos acompanhar a avaliação de todos os profissionais para diagnosticar o que poderia estar gerando dificuldade no ato de amamentar. Essa interdisciplinaridade foi extremamente importante no nosso entendimento dos casos clínicos, que foram discutidos após todos os atendimentos. Portanto, essas duas diferenças me surpreenderam positivamente, pois gostaria de realizar essas atividades clínicas em minha grade curricular da USP.

Ana Luiza: Em relação a minha grade, muda um pouco. Os pacientes são encaminhados da UBS (Unidade Básica de Saúde) para as clínicas da faculdade. As disciplinas clínicas são divididas conforme o SUS (Sistema Único de Saúde). 

O primeiro contato do paciente com a faculdade é através da clínica de atenção primária, onde as nossas disciplinas de dentística e de periodontia são atendidas juntas. Após as clínicas de atenção primária, os alunos têm clínicas especializadas como endodontia, cirurgia, prótese e odontopediatria. 

Eles também tem clínica de trauma, onde atendem pacientes encaminhados do hospital depois do atendimento de urgência/emergência. Lá eles tentam salvar dentes que não seriam salvos em outras clínicas, usando de muita criatividade. Nós não participamos dessa clínica, pois não tivemos durante a nossa semana. 

Participamos de uma aula teórica e de um laboratório de endodontia, e soubemos que eles também têm apostilas de todas as matérias para guiarem nas aulas e nos estudos.

Em relação aos estágios, nós precisamos cumprir 480 horas de estágio/atividades acadêmicas. Eles precisam cumprir 18 plantões de 12h cada no PSO que funciona, basicamente, como a clínica de urgência. No entanto, o PSO fica dentro do HU e funciona 24h, então, às vezes, eles precisam cumprir plantão noturno. Eu gostei muito do PSO. Acredito que os alunos saem da faculdade muito preparados para o mercado de trabalho. 

Como foi a rotina durante essa semana?

Diênifer: Foi intensa. Ficamos ocupadas nos três turnos de toda a semana (manhã, tarde e noite). Algumas semanas antes do nosso intercâmbio, a Professora e Coordenadora, Dra. Luciana Porto, entrou em contato conosco para saber de nossas preferências de disciplinas e, com isso, montou toda a nossa grade horária e nos deixou bem à vontade para acompanhar o que ela nos sugeriu ou participar de outro evento da nossa preferência. Como foi o caso de uma palestra que acompanhei, tornando mais um momento inesquecível da minha passagem por Uberlândia. Uma ex-aluna da FOUFU, chamada Rayssa Ferreira Zanatta, após exatos 15 anos retornou à Faculdade em que se graduou para ministrar uma aula para a pós-graduação sobre Inteligência Artificial. Essa aula não estava em nossa grade horária, mas ficamos interessadas e fomos. Para minha grata surpresa, essa ex-aluna se tornou professora doutora da UnB (Universidade de Brasília), cidade em que me criei. Recentemente ela esteve  no Japão, país que realizei meu intercâmbio internacional. Imagine o meu entusiasmo em ouvir toda a sua experiência, juntamente a tantos assuntos em comum. 

Ademais, acompanhamos as clínicas de propedêutica (estomatologia), integrada, DTM (semelhante à Liga de Dor Orofacial da FOUSP) e cirúrgica. Visitamos o Centro de Pesquisas Odontológico Biomecânica, Biomateriais e Biologia Celular (CPBIO) e o Laboratório de Endodontia. Frequentamos a aula de Odontologia Legal, o evento do Programa de Educação Tutorial (PET) e o Serviço de Atenção Domiciliar (SAD). Alguns desses eventos são da grade curricular da FOUFU e outros são projetos de extensão. Tivemos também atividades fora do ambiente acadêmico, como a abertura das olimpíadas da UFU com a presença do reitor e um jogo de vôlei entre os estudantes.

Ana Luiza: Cheguei no domingo de manhã e fomos assistir a um jogo das olimpíadas da UFU. 

Na segunda de manhã, participamos do ambulatório de freio, uma clínica de projeto de extensão e multidisciplinar (odontologia, fonoaudiologia, psicologia, nutrição entre outras áreas). Essa equipe cuida da mãe e do bebê, com possível indicação de frenectomia. Junto com a Diênifer, percebemos que, em muitos casos, a cirurgia de freio não é indicada, mas sim a orientação sobre a amamentação. À tarde, fomos para a clínica de cirurgia da graduação, onde auxiliei um estudante que extraiu dois sisos do mesmo lado. Ele me ofereceu para extrair um, mas não me senti confortável. Ao finalizar essa clínica, fui tomar café da tarde com alguns alunos. 

Na terça de manhã, tínhamos duas opções: clínica integrada ou teórica/laboratório de endodontia. Fomos na clínica integrada por 1h e depois partimos para o laboratório de endodontia. Percebi que o método endodôntico da UFU é muito semelhante ao nosso, embora eles não usem EDTA. A Coordenadora e Professora de endodontia Profa. Dra. Luciana, responsável pela nossa recepção, também nos levou para conhecer a faculdade e nos recebeu muito bem. À tarde, participamos da clínica de odontopediatria, muito semelhante a nossa, porém cada aluno da dupla deve atender um paciente por dia, ou seja, a dupla atende dois pacientes por dia. Finalizamos a noite com uma aula da Dienifer na liga de odontopediatria. 

Na quarta de manhã, íamos conhecer os laboratórios de pesquisa da faculdade, mas, por sugestão da coordenadora Luciana, fomos assistir a aula inaugural da pós-graduação sobre inteligência artificial. A aula durou um pouco mais de 4h, mas foi incrível, o que até me fez pensar em fazer mestrado em inteligência artificial na área de odontologia forense. À tarde, participei da aula de odontologia forense, a qual tivemos uma aula teórica e prática maravilhosa sobre local de crime, e finalizamos com uma aula de um profissional de seguros. 

Logo depois, participamos de uma atividade do PET “Cuidando de quem cuida”, que consistiu em uma roda de conversa com alunos da área da saúde que participam do PET e uma psicóloga como intermediadora, além de um coffee break maravilhoso com pão de queijo, claro, estou falando de Minas.

Na quinta de manhã, fomos conhecer os laboratórios de pesquisa com uma doutoranda que nos mostrou e nos explicou, resumidamente, a funcionalidade de cada laboratório e maquinário. À tarde, eu fui conhecer o PSO e auxiliei uma aluna que em 4h que estive lá, extraiu dois dentes molares, diagnosticou e tratou alveolite. 

Na sexta à tarde, Diênifer e eu participamos do SAD (Serviço de Atendimento Domiciliar). Fomos com uma professora, um aluno de graduação e o motorista da faculdade, visitar duas famílias que têm crianças acamadas. Essa tarde me surpreendeu muito, pois as crianças respiram e se alimentam com o auxílio de aparelhos, não falam e não andam. A primeira criança foi uma menina de 8 anos, mas parecia que tinha 2 anos. Ela tinha nanismo e outra síndrome. Outro fator importante é o fato de que, muitas vezes, a equipe planeja realizar algum procedimento, como cirurgia, e não consegue na visita planejada devido ao estado de saúde da criança naquele dia. Então, a equipe realiza a higiene bucal da criança e orienta os pais quanto a higiene oral da mesma. Eles também tem o SAD de adulto, mas não participamos. 

Teve alguma dificuldade que encontrou durante o intercâmbio?

Diênifer: Não diria dificuldade, apenas passamos bastante calor, e ao meu ver, não tem nada que deixe a desejar em relação ao ensino da FOUSP.  

Ana Luiza: Nenhuma. Nós fomos muito bem recebidas por todos de lá (professores, alunos e funcionários). 

Com o que você mais se surpreendeu lá?

Diênifer: Com o acolhimento, pois, por exemplo, ao entrar em contato com a Liga de Odontopediatria da FOUFU para o compartilhamento de conhecimentos do Grupo de Pesquisa Hipomineralização Molar-Incisivo (HMI), o qual faço parte e tenho bastante interesse, a Liga abriu as portas e me convidou para ministrar uma aula aberta sobre as experiências que temos na FOUSP. Este momento foi extremamente significativo para mim. Falei do que mais amo fazer na FOUSP, recebi perguntas e convidei todos para conhecer a nossa faculdade. Um momento ímpar que ficará para sempre em minha memória. Recebi um presente da diretoria da liga e senti um contato muito próximo dos professores com os alunos da FOUFU, e na semana em que fiquei, senti comigo também. Além de terem me emprestado roupas da atlética deles para que eu entrasse na abertura dos jogos, me senti literalmente uma universitária da FOUFU.

Ana Luiza: Com o SAD (Serviço de Atendimento Domiciliar), que expliquei melhor anteriormente.

Por ser um intercâmbio de formato inédito na FOUSP, você recomendaria? Valeu a pena?

Diênifer: Eu super recomendaria, sem a menor sombra de dúvidas. Valeu cada segundo com todos que tive a honra de conhecer.

Ana Luiza: Com certeza. Eu considero o intercâmbio nacional uma das melhores experiências que eu tive na FOUSP, já que tive que sair da minha zona de conforto. Foi uma semana super intensa. Quando conhecemos a faculdade, participamos das atividades e também fizemos amigos que nos acolheram e que espero que possamos levar para a vida.

Fotos: Diênifer Birmann Ramos e Ana Luiza Lucena Longo